terça-feira, 18 de agosto de 2009

De mudança...

Estamos mudando.

Em breve teremos novidades. Por isso ficaremos um tempo sem atualização.

Abraços.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Tríade

Hécate é a mais jovem. Se mostra como uma dama entre a adolescência e a juventude. Seu rosto é delicado e bonito, emoldurado por cabelos longos, muito escuros, que contrastam com a túnica branca. Tem dois braços, mas três rostos, que olham em direções diferentes - para frente e para os lados, jamais para trás. Em cada uma das mãos carrega uma tocha. Uma tiara de pedras adorna seus cabelos, negros como a noite.

Perséfone é mais velha, mas não tanto assim. Sua roupa é clara e escura, porque os dois tons são parte dela. Transita na penumbra, mas deixa o sol iluminar seu rosto e seu corpo quando sobe ao encontro de sua mãe. Não é muito amiga do Sol, na verdade. Prefere a noite, o escuro e a Lua. Seu rosto não é simples de ser visto, talvez por ser casada com o deus que não se mostra. Mas usa jóias de rainha e prende delicademente o cabelo com uma coroa prateada.

Deméter é a mais velha das três. Tem olhos astutos e cabelos opulentos. É alta e grande, se movimenta com uma certa dureza e com passos firmes. Veste-se de azul e o trigo dourado adorna seus cabelos. Não usa jóias. Evita ocasiões sociais, mas não se importa de rever a família vez ou outra. Prefere o sol à lua, a lagarta à borboleta, o claro ao escuro, o calor ao frio. Anda descalça e não gosta que falem dela. Nem de suas artes. Nem de seu culto.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Hino Órfico à Thethys


Eu lhe chamo Tethys dos olhos de azulado brilho, que se escondem dos humanos por trás de um véu de obscuridade;

Grande imperatriz do Oceano, que vaga pelas profundezas e que molha a terra com sua brisa suave;

Aquela para a qual as ondas abençoadas seguem em sucessão, batendo nos rochedos em um fluxo sem fim:

Deliciando-se no mar sereno a brincar, nos navios que exultam pelo caminho molhado.

Mãe da Cípria e das nuvens obscuras, grande cuidadora das bestas e doadora das fontes de água pura.

Ó venerável Deusa, ouça minha prece e traga a benevolência à minha vida;

Envie, rainha abençoada, aos navios a próspera brisa, e os traga seguros pelos mares tormentosos.


Hino publicado em inglês no Theoi Project.
Tradução livre.
Imagem de waver-h

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Escuro

Ele está sentado no chão. Veste-se inteiro de preto. Sua cabeça esconde-se, coberta com um lenço grosso, deixando o rosto na penumbra.

A recém-iniciada segura a saia e se ajeita ao lado do Escuro, como se fossem velhos amigos. Seu vestido traz as cores de Deméter e os cabelos desalinhados ainda trazem as evidências de terem portado a coroa de trigo da deusa.

No breu à volta deles, ela treme. O medo a domina e ela não entende a razão. O Senhor dos Mortos nunca lhe causou nenhum mal. Pelo contrário, ela só tem a agradecer ao Muito Rico por tudo o que Ele já fez em sua vida.

Ele se vira, bruscamente, e o rosto do Deus está a centímetros do nariz da garota. Mas onde deveria haver olhos, existem dois buracos. No lugar da carne azulada e fria de Hades, o deus mostra ossos. Um crânio, seco e vleho, a olha do véu escuro do Soberano do Submundo.

O medo do desconhecido a toma por inteiro, mas ela não consegue gritar.

Imagem de NathanRosario

terça-feira, 14 de julho de 2009

O Mensageiro

De riso fácil e cheio de galanteios, Hermes tem passagem livre por todos os cantos. Não há Deus que não dê abrigo ao mensageiro, assim como não há homem que não tenha prestado reverência ao Senhor do Caminhos.

Com seu saco de correspondências e sua capa de viagem, ele transita por todas as partes, parando aqui para deixar um recado, ali para elogiar uma ninfa e do outro lado para enganar um viajante. Hermes, de asas nos pés, consegue dobrar a austeridade de Apollo com o mesmo traquejo que vai ao Hades levando as almas de encontro ao Rei dos Mortos e à Sua Rainha.

Mas, acima de tudo, Hermes é o mensageiro de Zeus. Sem ele, não haveria a comunicação entre deuses e homens. E se os homens não ouvem as vozes dos deuses, a culpa não é dele. Os humanos é que não se dão ao trabalho de perceber que os imortais sempre respondem.

E se não o fizerem, o mensageiro trata logo de inventar alguma ladainha para não decepcionar o pedinte. Afinal, seu alimento é o deboche, como ele diz, e sua natureza não o faria perder a oportunidade de exercitar essa arte.

Imagem de h_savill no Flickr.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

das Filhas de Rhea


























Se os três filhos de Cronos representam o domínio dos monarcas, as três filhas de Rhea nasceram com outro tipo de poder.

Sutil. Escondido. Feminino.

Sentadas no conselho do Olimpo, tecendo juntas em momentos doméstico ou formando a bela figura em banquetes, esse é o papel das filhas: não mandam, mas se sentam ao lado de quem o faz.

Ainda tem seu lugar no Conselho a matrona entre as matronas, Héstia. Mesmo tendo cedido o posto de Olimpiana ao sobrinho Dionísio, ela ainda guarda um lugar de honra. Parece mais velha do que a própria mãe, sentada silenciosa. Ela não se mostra cheia de jóias, nem é trazida aos salões pelo braço de um deus como suas irmãs. Não permitiu que nenhum deles o fizesse, e Zeus não desrespeitou sua vontade. Afinal, esse é seu papel: a união do genos diante da lareira do Olimpo.

Há alguns acentos do Pater, senta-se Deméter, medida entre a serenidade da mais velha e a impetuosidade da irmã subsequente. É mãe sem ser esposa. É rainha sem ter coroa. Os deuses sabem que não é bom perturbá-la e suas maneiras severas são famosas entre os irmãos e sobrinhos e reclamadas sempre que necessário. Não raro, se deixa levar pelos braços do neto três vezes nascido, já que o casamento não é seu território: prefere os filhos - e o doce isolamento entre os humanos.

A caçula entre as mulheres, Senhora do Olimpo, fica ao lado do Rei. Não seria diferente, já que na família o quinhão de Hera é ser esposa. Mais do que mãe, mais do que irmã, ela é a coroa que adorna a cabeça de Zeus, a deusa emplumada que resplande ao seu lado. E graças a Ela, outros casamentos essenciais ao universo se configuram - Perséfone e Hades, Posseidon e Anfitrite, Hércules e Hebe, Afrodite e Hesfesto.

E assim as três participam das grandes decisões. E enquanto eles conversam, as outras gerações, olhando os seis Crônidas, sabem que é ali que reside todo o poder da nova geração de deuses. E que sem um deles, há o desequilíbrio, a fome, a tempestade, o maremoto, a desunião e a morte.

Imagem de andyparkat.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Branco


Andávamos na beira, naquele ponto da praia em que as ondas quebram deixando restos de conchas e outras coisas que o mar dispensa. Eu pensava na vida. Ele segurava minha mão e caminhava apressado. Depois de um curto silêncio, me faz uma pergunta mais do que inesperada:


- Mas como é que que Ela nasce?

A "Ela" da frase é Afrodite.

Ele é a própria figura da deusa, aparecendo como um presente enviado pela Dourada. Ele traz na sua formação sombra e luta, permeadas do perfume das orquídeas, planta consagrada a Urano, cujo membro decepado fez a deusa surgir do mar.

É essa a história que conto, enquanto caminhamos pela areia.

Falo da minha versão preferida, a registrada por Hesíodo - inspirada pelas musas, transmitida pelo povo, como gosto de lembrar para mim mesa. Sob o céu escuro de chuva, conto como Cronos, com sua foice em curva, amputou o pênis de Urano. Falo, ainda, do pênis caindo nas ondas e ejaculando seu sêmen sobre a espuma. Imagino a subida de Afrodite nesse momento, de sua criação na mistura dos brancos, ao mesmo tempo em que, ao seu lado, Nêmesis surge do vermelho sangue. Em todo seu esplendor, a Citeréia é levada em uma concha para a ilha mais próxima, acolhida pelas Graças e por Eros, compondo assim um cortejo de beleza, de doçura e de amargor.

As ondas quebram nos nosso pés. Ele olha para o horizonte. Eu digo que existe outra história, a de que Ela seria filha de Zeus e Dione, a imagem feminina do Tonante.

- Mas isso não é verdade.
- Como você sabe?
- Zeus me contou um dia desses.

Imagem de Noel back in Zurich.
Retirado do Flickr.

p.s.: O Blogger está com problema. Por isso o texto desta postagem pode aparecer com mais de uma fonte.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Voltando

Peço desculpas pelo tempo sem atualizações.
A vida me engoliu e, infelizmente, deixei de lado este blog.
Volto a aparecer por aqui.

Aproveitando a ocasião, acrescentei no Blogroll alguns sites que fizeram a gentileza de nos linkar: Stregheria Pratica, Cerealia e Helenismo: Tradição, Postura e Ética. Muito obrigada pela lembrança.

Com as bênçãos de Rhea Cibele e Perséfone.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Conversa Olimpiana

Quando Zeus entrou no grande salão, Deméter já estava lá. Sentada em seu trono, menor do que as três grandes cadeiras ao seu lado direito, a deusa bebericava um copo de ouro. O rei parou, braços cruzados nas costas, na porta da sala:

- Chegou cedo.
- Eu sei.
- Muito trabalho?
- Sim.
- Acompanho a vida humana pelo meu mensageiro. Ele diz que as coisas não andam bem.
- Ele tem um bom olho para perceber as coisas humanas.

Ele sentou-se no maior trono de todos, deixando um assento vago do lugar onde a Deusa estava. Quando Zeus olhou novamente para Deméter, ela estava de olhos fechados, esfregando a mão nas pálpebras abaixadas. Ele se lembrou de quando a procurou para conceberem Perséfone. Deméter nunca foi a mais bela das deusas, mas a sua maturidade sempre lhe foi atraente, de alguma forma.

- O Inverno está rigoroso demais no Norte e o Verão chuvoso demais no Sul. - Ela disse, tirando-o de seus pensamentos.

Zeus ficou em silêncio por um momento. Deméter olhou, cansada, para o irmão:

- Isso quer dizer que nenhum dos dois hemisférios vai ter alimento suficiente.
- Eu sei. Mas ainda não é cedo demais para o Norte se preocupar com isso?
- Não. Cedo ou tarde, teremos problemas do mesmo jeito.
- Você terá problemas.
- Sim, eu terei problemas.

Ela se irritava quando o irmão dava a entender que humanidade não era de sua responsabilidade. E Ele sabia disso.

Enquanto ignorava o comentário, ela levou a taça de ouro aos lábios novamente. Pela borda, observou Ganymedes aproximar-se de Zeus, com um movimento sutil. Reverenciou o deus e ofereceu-lhe uma taça de ouro, mais suntuosa do que a de Deméter, e serviu o líquido dourado que saía de uma enorme jarra de prata. Foi até a Deusa e ofereceu o mesmo conteúdo. Ela sorriu e lhe entregou a taça vazia.

- Obrigada. É suficiente por hoje.

Deméter levantou-se. Zeus a olhava, voltando a pensar em como poderia deitar-se com Ela novamente, se Deméter permitisse. Ela andou até a beirada de uma das varandas e voltou a falar:

- As comoditties de algumas safras vão aumentar. Acho que Hermes deveria ser avisado.
- Creio que ele já está ciente, mas irei alertá-lo do mesmo jeito.
- Acho que eu e ele teremos muito trabalho para controlar tudo isso.
- Ainda penso que é melhor vocês deixarem os humanos com suas próprias crises.
- Nosso papel é ajudá-los.
- Não é. Nosso papel é deixar que cada elemento de vida se coloque em seu lugar. Às vezes precisamos ser duros para que eles acertem os eixos.
- Eu sei. Talvez você tenha razão.
- Eu tenho razão.
- Por isso você é o Rei dos Deuses e dos Homens.
- Exatamente.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

O Arqueiro

O Longíncuo prepara o arco. Posiciona a flecha. Tensiosa. Mira. Solta.

Mais um filho de Níobe é abatido. O último.

Ele olha para a irmã. Os letóides não precisam de palavras para se entender. Em um instante, ambos desaparecem das vistas mortais - que se desesperam pela perda de tantos príncipes e princesas. Ártemis vai direto ao encontro da mãe, para reportar-lhe sobre a vingança aplicada aos niobidas. Apollo retorna, sozinho, a Delfos.

Em seus domínios, o deus se lava nas fontes sagradas: não suporta o cheiro de sangue humano impregnado nas suas narinas, mesmo que o líqüido não tenha atingido seu corpo. Dizem que ele sente nojo das pessoas e, por conta desse fator, evita aproximar-se. Mas quem fala dessa forma não percebe que a sujeira e a morte não são parte da sua distante natureza. O deus evita esses fatores e, por conseqüência, quem os traz de forma mais marcante: os seres mortais.

Arqueiros, ensina a sabedoria de Delfos, não têm contato com a carne que apodrece. Eles alvejam os inimigos do alto das muralhas, como ele acabou de fazer. "Sujo de Sangue" é um nome que não pertence a esses soldados. A Infantaria e a Cavalaria existem em outros domínios.

Limpo, o profeta de Zeus coloca uma nova coroa de louros recém-colhidos. Senta-se à sombra das árvores, com a lira em uma das mãos, substituindo o arco prateado. As musas, percebendo o momento propício, aproximam-se com canto e dança. O deus fecha os olhos e sorri, em um de seus não raros momentos de contemplação. Sentado no templo, cuidado por suas companheiras e sacerdotes, Apollo descansa de sua ira calculada e passageira.

Imagem de Roy Mahon, "Archer in Desert"